Reforma tributária: grupo de deputados mantém imposto sobre carne bovina e propõe debater ‘cashback’ para os mais pobres

Reforma tributária: grupo de deputados mantém imposto sobre carne bovina e propõe debater ‘cashback’ para os mais pobres

Para ter validade, a proposta ainda terá de ser votada pelos plenários da Câmara e do Senado Federal. Deputados podem votar já na próxima semana. O grupo de trabalho da Câmara dos Deputados que avalia a regulamentação da reforma tributária propôs a manutenção da carne bovina, e o frango, com taxação parcial dos futuros tributos sobre o consumo.
A proposta, que ainda terá de ser votada para ter validade, foi apresentada nesta quinta-feira (4). A expectativa é de que o texto seja submetido ao plenário da Câmara na próxima semana.
A carne bovina e a de frango continuam, dessa forma, na cesta básica com taxação parcial (alíquota de 40% do total) na proposta da equipe econômica.
Hoje, a carne bovina e o frango, estão isentos de impostos federais (como IPI, PIS e Cofins). A maioria dos estados, no entanto, cobra o ICMS sobre os produtos.
Todos esses tributos serão substituídos, nos próximos anos, pelo IBS e pela CBS, impostos sobre o valor agregado dos estados, municípios e da União. Por isso, a regra está sendo rediscutida.
Pela reforma tributária , a taxação passará a ser não cumulativa, ou seja, cada empresa pagará somente o valor que lhe couber na produção, obtendo crédito pelos insumos utilizados.
“A gente sempre dizia que qualquer concessão que a gente pudesse fazer, a gente iria ver de onde iria tirar a despesa. E na verdade, o impacto da questão da carne é muito substancial na taxa base já cobrada”, afirmou o relator do grupo de trabalho, deputado Augusto Coutinho (Republicanos-PE).
“A gente preferiu, inclusive, que a questão do cashback para a população de baixa renda fosse compensada, para que de fato quem tivesse o benefício fosse a população mais pobre, a população que de fato precisa ter o incentivo da tarifa zero”, disse.
Pelo sistema de cashback citado pelo deputado, se aprovado, todos os consumidores pagariam o imposto na hora da compra – mas os mais pobres receberiam esse dinheiro de volta, nos cartões do Cadastro Único (Cadúnico) ou em algum outro método a ser definido.
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Impacto na ‘alíquota de referência’
A resistência em incluir todas as carnes na cesta básica sem impostos tem a ver com a alíquota de referência, ou seja, aquela que será cobrada em todos os produtos que não tiverem benefícios.
Essa alíquota de referência é estimada atualmente em 26,5% – mas pode ficar ainda maior, quanto maior for a lista de exceções à tributação geral.
Se todas as carnes fossem desoneradas, essa alíquota de referência subiria 0,6 ponto percentual, para 27,1% — configurando a maior do mundo. Atualmente, a Hungria tem a maior taxação sobre o consumo, com tributação de 27%.
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Lula e a picanha
Nesta semana, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva defendeu que o Congresso incluísse na cesta básica apenas cortes específicos de carne, levando em consideração o que as populações mais pobres consomem.
“Eu acho que temos que fazer diferenciação. Você tem vários tipos de carne, tem carne chique, de primeiríssima qualidade, que o cara que consome pode pagar um impostozinho. Agora, você tem outro tipo de carne, que é a carne que o povo consome. Frango, por exemplo, não precisa ter imposto. Frango faz parte do dia a dia do povo brasileiro, ovo faz parte do dia a dia. Uma carne, sabe, um músculo, um acém, coxão mole, tudo isso pode ser evitado”, disse Lula, nesta terça-feira (2).
O desejo do presidente, entretanto, esbarra em questões técnicas. Segundo o Ministério da Fazenda, seria inviável diferenciar a tributação por tipo de carne bovina, pois não seria possível fiscalizar.
“Todo esse sistema da Receita, a fiscalização é feita com uma classificação padrão. E como é que as carnes aparecem lá. Você divide o boi no meio e em quartos. Então só tem duas classificações lá, o quarto dianteiro e o quarto traseiro. Normalmente as carnes nobres estão no quarto traseiro. Mas aí você tem várias anedotas de auditores que diziam que estados que fizeram isso e o fiscal chegou lá e todos os bois eram bípedes, porque só tinham quartos dianteiros”, explicou do diretor de programa da Secretaria Extraordinária da Reforma Tributária do Ministério da Fazenda, Rodrigo Orair, em abril.
Segundo informou ele, na ocasião, “não dá para o fiscal da receita fiscalizar”, do ponto de vista operacional, a tributação por tipo de corte de carne bovina. “Imagina uma picanha, uma picanha é o corte. Se você cortar dessa veia, chama picanha, se corta pra cá, chama coxão. Não dá pra ficar fiscalizando se o cara cortou aqui ou não, dá pra fiscalizar a espécie. Sabe que é carne bovina, suina, frango, caprino”, acrescentou.
Na quarta-feira (3), Lula voltou ao tema, e desse vez sugeriu diferenciar tributação da carne in natura da processada, com a carne in natura desonerada de impostos. “
“Na verdade não temos como separar, vamos ter que entender que possivelmente a gente tenha que separar carne in natura e processada, mas sou daqueles que vou ficar feliz se eu puder comprar carne sem imposto, prometi na campanha que o povo ia voltar a comer picanha e tomar cerveja”, disse Lula, na ocasião.
Redução da tributação sobre carnes
Mesmo enquadrando as carnes com taxação de 40% dos futuros impostos sobre valor agregado da União (CBS) e dos estados e municípios (IBS), a equipe econômica do governo Lula alega que haverá redução na tributação em relação ao patamar atual.
Isso ocorre porque, mesmo estando isentas de impostos federais, as carnes são taxadas pelo ICMS estadual.
O governo diz, com isso, que o peso dos impostos sobre as carnes, de uma forma geral, está em 12,7% atualmente (considerando o ICMS estadual e, também, resíduos tributários, ou seja, impostos sobre impostos).
Com a tributação parcial instituída pela reforma tributária, que vai passar a cobrar impostos não cumulativos, a área econômica diz que o peso dos tributos vai cair para 10,6%.
De acordo com o secretário Bernard Appy, do Ministério da Fazenda, a população de baixa renda, cerca de 73 milhões de pessoas, terá direito ao abatimento de 20% no chamado “cashback” — devolução do imposto pago. Para esse público, a alíquota seria menor ainda, de 8,5%.
Regulamentação da reforma tributária
Pontos importantes, como o fim da cumulatividade, a cobrança dos impostos no destino, simplificação e fim de distorções na economia (como passeio de notas fiscais e do imposto cobrado “por dentro”) já foram assegurados na PEC da reforma tributária — aprovada e promulgada no fim do ano passado pelo Legislativo.
Entretanto, vários temas sensíveis ficaram para o ano de 2024, pois o texto da PEC indica a necessidade de regulamentação de alguns assuntos por meio de projetos de lei. O governo enviou sua proposta em abril, e nesta quinta-feira os deputados propuseram algumas alterações.
O cronograma da Fazenda prevê que a regulamentação será feita entre 2024 e 2025. Com o término dessa fase, poderá ter início, em 2026, a transição dos atuais impostos para o modelo de Imposto sobre Valor Agregado (IVA) — com cobrança não cumulativa.
Pontos básicos
Pela proposta de emenda à Constituição (PEC), cinco tributos serão substituídos por dois Impostos sobre Valor Agregado (IVAs) — com legislação única, sendo um gerenciado pela União e outro com gestão compartilhada entre estados e municípios:
▶️ Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS): com gestão federal, vai unificar IPI, PIS e Cofins;
▶️ Imposto sobre Bens e Serviços (IBS): com gestão compartilhada estados e municípios, unificará ICMS (estadual) e ISS (municipal).
▶️ Além da CBS federal e do IBS estadual e municipal, será cobrado um imposto seletivo (sobre produtos nocivos à saúde) e um IPI sobre produtos produzidos pela Zona Franca de Manaus — mas fora da região com benefício fiscal.
Estimativas apontam que os futuros impostos sobre o consumo, para manter a atual carga tributária – considerada elevada -, somariam cerca de 26,5% – e estariam entre os maiores do mundo.
A alíquota final dos impostos, porém, só será conhecida nos próximos anos — após a realização de um período de testes para “calibrar” o valor — necessário para manter a carga tributária atual.

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