Pandemia e falta de insumos já afetaram indústria em fevereiro e quadro deve piorar

Pandemia e falta de insumos já afetaram indústria em fevereiro e quadro deve piorar

Antecipando um quadro esperado a partir de março, o agravamento da pandemia e a escassez de alguns insumos já frearam a atividade da indústria em fevereiro, tendência que deve se aprofundar no curto prazo, avaliam economistas. Divulgada nesta quinta-feira pelo IBGE, a Pesquisa Industrial Mensal (PIM-PF) mostrou que a produção industrial caiu 0,7% sobre janeiro, feitos os ajustes sazonais, após nove altas seguidas nessa comparação.

A estimativa mediana de 35 analistas ouvidos pelo Valor Data apontava avanço de 0,4% na passagem mensal. Em relação a fevereiro de 2020, a produção subiu 0,4%, mas o resultado também frustrou os economistas, que previam expansão de 2%. Com o aumento das restrições à mobilidade, a perspectiva é que o desempenho negativo da indústria seja mais forte em março.

Na passagem mensal, a queda da indústria foi espalhada por três das quatro grande categorias econômicas pesquisadas pelo IBGE, com destaque para a de bens de consumo duráveis, cuja produção diminuiu 4,6%. Já a fabricação de bens de capital caiu 1,5%, primeiro comportamento negativo desde abril do ano passado.

Na análise por ramos de atividade, a queda de 0,7% em fevereiro foi espalhada por 14 dos 26 segmentos analisados. A maior influência negativa sobre o resultado mensal partiu do setor de veículos automotores, reboques e carrocerias, que reduziu sua produção em 7,2% sobre janeiro.

“Fomos surpreendidos com queda maior que a esperada na produção de automóveis em fevereiro”, diz Roberto Secemski, economista-chefe para Brasil do Barclays. Possivelmente, afirma Secemski, a retração foi explicada pelo enfraquecimento da demanda após a retirada dos estímulos e, também, pela falta de alguns insumos, que levaram a interrupções da produção no Polo Industrial de Manaus nos dois primeiros meses do ano.

“O cenário de curto prazo para o setor é desafiador. A pandemia provocou paralisações na produção e causou restrições globais de oferta, especialmente de semicondutores”, aponta Andres Abadia, economista-chefe para América Latina da Pantheon Macroeconomics. De forma geral, a piora da pandemia é “a maior culpada” pela queda da produção industrial no segundo mês do ano, avalia Abadia.

Para Maurício Une, economista-chefe do Rabobank para Brasil e América do Sul, embora esse quadro seja esperado a partir de março, a segunda onda mais forte de covid-19 ainda não afetou a atividade industrial em fevereiro. Em sua visão, a redução veio na esteira do aumento das incertezas no cenário econômico e do efeito disso nas expectativas dos empresários industriais, que, com dúvidas sobre o futuro, preferiram não elevar a produção.

“Nos dados de confiança da Fundação Getulio Vargas (FGV), conseguimos entender um pouco da apreensão da indústria com relação aos programas de sustentação da renda, que estavam em debate ao longo de fevereiro”, comentou Une. Se, na medição atual do IBGE, ainda não é possível identificar impactos da maior disseminação da covid-19, em março a pandemia deve provocar retração mais intensa da atividade nas fábricas, avalia ele.

“Com certeza estamos indo para uma queda maior do que a observada em fevereiro. Com os feriados prolongados em algumas regiões metropolitanas, a mobilidade já foi bem menor em março”, observa o economista do Rabobank. “Esperamos ver nova queda da produção de automóveis em março, não só por restrição de insumos, mas principalmente por conta dos novos ‘lockdowns’ implementados em muitos Estados nas últimas semanas”, disse Secemski.

Devido ao avanço da crise causada pelo coronavírus no Brasil, a atividade industrial deve aprofundar sua queda no curto prazo, concorda Rodolfo Margato, economista da XP Investimentos. Com poucos indicadores coincidentes divulgados para o período, a plataforma de investimentos tem projeção preliminar de retração de 1,7% para a produção no mês de março.

Segundo Margato, a possível escassez de insumos em alguns setores industriais permanece como um risco a ser monitorado nos próximos meses. Por outro lado, a equipe econômica da XP não espera problemas generalizados nas cadeias de suprimentos, o que corrobora a percepção de que o declínio da produção industrial no curto prazo será muito mais suave do que o observado no primeiro semestre do ano passado, pondera o economista.

Ainda que a demanda por bens duráveis tenha se enfraquecido nos últimos meses, como provável reflexo do fim do auxílio emergencial, a necessidade de recomposição de estoques, que permanecem baixos, deve permitir alguma recuperação da produção conforme os “lockdowns” regionais sejam abrandados, avalia Secemski, do Barclays.

Olhando à frente, as maiores dúvidas no cenário são sobre a evolução da pandemia e o ritmo de vacinação, que parece estar melhorando, mas as novas entregas de vacinas aos institutos, anunciadas para abril, ainda geram incertezas, diz Une, do Rabobank. Por isso, o banco prefere manter a expectativa de alta de 3% para o Produto Interno Bruto (PIB) em 2021, que Une classifica como conservadora. Esse número começou o ano em 3,5%, lembra ele.

Todos os economistas ouvidos afirmam que o resultado da indústria reforçou a percepção de fraqueza da atividade no primeiro trimestre, e mantiveram suas estimativas para o comportamento do PIB no período. O Barclays trabalha com queda de 0,3% do PIB frente ao último trimestre de 2020, feitos os ajustes sazonais, enquanto Rabobank e XP preveem relativa estabilidade, com alta de 0,1% no período.

1 de 1 — Foto: Dado Galdieri/Bloombergc

— Foto: Dado Galdieri/Bloombergc

bratings01

Os comentários estão fechados.

Proudly powered by WordPress | Theme: Content by SpiceThemes