Vice-líder do governo afirma que Planalto está desarticulado na CPI

Vice-líder do governo afirma que Planalto está desarticulado na CPI

A menos de uma semana para a instalação da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) da Pandemia, o governo Jair Bolsonaro segue “desarticulado”. A avaliação é do próprio vice-líder do governo no Congresso, senador Marcos Rogério (DEM-RO), que cobra um “esforço” do Palácio do Planalto para que as investigações aconteçam de maneira “minimamente justa”. Indicado como um dos representantes do Executivo na CPI, ele avisa: não será um “longa manus”, expressão que designa o cumpridor de ordens. “Sou vice-líder do governo, mas isso não me impede de executar um papel de investigação. Eu vou cumprir o meu papel”, afirma.

O senador e líder do DEM falou sobre o assunto em conversa com a imprensa nesta terça-feira. Segundo ele, a ministra da Secretaria de Governo, Flávia Arruda (PP-DF), já foi informada sobre o cenário desfavorável.

“Foi uma conversa boa. Depois da repercussão toda, ela me ligou [na segunda-feira] querendo saber o que está acontecendo e eu disse: ‘Olha, não é o que está acontecendo, é o que não está acontecendo’. Você está diante de uma situação em que um lado está muito articulado e o outro está totalmente desarticulado. Ela disse que acabou de assumir… Eu entendi as justificativas dela. Mas eu acho que, em uma situação como essa, base e oposição, é preciso conversar. Não pode deixar todo mundo agir [por si só]”, afirmou.

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Marcos Rogério — Foto: Marcos Oliveira/Agência Senado

Marcos Rogério — Foto: Marcos Oliveira/Agência Senado

Na avaliação dele, faltou “cautela” e “cuidado” do governo na hora de tentar influenciar as indicações feitas pelos partidos para a composição da CPI, cuja maioria dos integrantes é de oposição ou tem uma postura independente em relação ao Executivo. Na prática, de um total de 11 membros, 7 estão fora da base aliada e só 4 se identificam como governistas ou têm algum alinhamento ideológico com o Executivo.

“Quando da composição da CPI, não houve, por parte de quem faz a inteligência da política do governo, uma cautela em relação às indicações. Quem quis ir [para a CPI] foi”, disse Marcos Rogério.

“Acho que, se você olhar do ponto de vista de avaliação política do governo em relação à composição dela, o governo não teve cuidado de tentar. Se o partido A tem uma ligação com o governo e em alguma medida ele tem uma vaga ou duas vagas [na CPI] e ele indica dois [parlamentares] de oposição, tem alguma coisa fora do lugar”, completou, sem citar diretamente as legendas as quais estava se referindo.

Apesar de o senador evitar falar em nomes, o caso mais emblemático é o do MDB. A sigla tem dois parlamentares responsáveis pela articulação do governo – Fernando Bezerra Coelho (MDB-PE), no Senado, e Eduardo Gomes (MDB-TO), no Congresso –, mas, mesmo assim, indicou dois senadores considerados hostis a Bolsonaro: Renan Calheiros (MDB-AL) e Eduardo Braga (MDB-AM), que adotou tom mais crítico após o colapso sofrido pelo Amazonas, seu berço eleitoral.

“Não quero colocar nomes nos partidos. Acho que essa é uma avaliação que quem tem que fazer é o governo e o próprio partido que, de repente, tenha algum nível de relação com o governo. Não cabe a mim, que sou de outro partido e líder de outro partido, julgar a relação, seja do MDB ou de outro partido, com o governo. Agora, o governo precisa fazer esse julgamento. Quem escala alguém para ser seu representante precisa ter algum nível de relação institucional com esse ou aquele partido”, disse.

“Mas, enfim, acho que as coisas ainda estão acontecendo e talvez até semana que vem tenha novidade”, concluiu o líder do DEM, que recentemente apareceu entre os nomes cotados para assumir a representação do governo na Casa.

Diante do cenário adverso, Marcos Rogério procurou enfatizar que não será um cumpridor de ordens do governo. “Não vou estar na CPI, como já estive em Conselho de Ética, para ser um “longa manus” de investigado. É claro que eu tenho um alinhamento político com o governo, sou vice-líder do governo, mas isso não me impede de executar um papel de investigação, que é o papel da CPI, dentro de um escopo da CPI, eu vou cumprir o meu papel”.

“Se erros houve, e naturalmente quem está na vida pública está sujeito a acertos e erros, eles têm de ser apurados e, na dimensão da boa fé ou da má fé, eles têm de ser julgados”, disse.

Questionado se percebeu alguma melhora na articulação nos últimos dias, o vice-líder do governo elogiou a postura do presidente Bolsonaro diante da CPI, mas admitiu que ele sempre conduziu sua base de maneira “fluida”, o que não seria o ideal para um momento “sensível” como este.

“Eu vou ser muito sincero. Se houve algum nível de articulação, eu desconheço, até agora. Acho que o presidente Bolsonaro… Eu convivi com ele como deputado federal… Não é uma surpresa a maneira como ele verbaliza as posições dele. Como ele se coloca não é novidade porque ele sempre foi assim. Mas o jeito dele lidar com a questão da base sempre foi meio […] a coisa meio que ia fluindo”, respondeu.

“Agora, num momento como esse, num tema mais sensível, como é uma CPI, e sobretudo em um momento como esse que o Brasil está atravessando, eu penso que seria necessário um pouco mais de articulação. Não é para mudar os rumos de uma investigação, é para garantir que ela seja minimamente justa, só isso. Eu acho que o governo do presidente não tem que temer a investigação. Se ele sabe do que fez e como fez, não tem por que temer a investigação. Apenas tem que ter um esforço para garantir que ela seja justa e que ela faça as apurações que são necessárias e na extensão que deve ser para chegar aonde está o problema”, complementou.

Em relação ao andamento da CPI, Marcos Rogério criticou o que chamou de “pré-julgamento” dos fatos, algo que estaria acontecendo, na sua visão, antes mesmo do início das oitivas. Para o senador, os parlamentares não devem julgar ações do passado com os olhos de hoje, com as informações que estão consolidadas atualmente, mais de um ano depois do início da crise.

“Não posso partir de uma premissa de que eu já sei onde está o problema. Tenho que partir de uma premissa que leve em consideração a busca pela verdade, esteja ela onde estiver. Se houve, por parte da gestão do ministro [Eduardo] Pazuello à frente do Ministério da Saúde, o epicentro do problema, ele vai ser identificado. Agora, pode ser que não seja. Acho que você teve situações”, disse.

“Você pegar o início da gestão, quando começou a crise sanitária, os primeiros focos e tal, o ministro era o [Luiz Henrique] Mandetta. Naquele momento era possível cobrar o que é possível cobrar hoje? Não. O mundo não estava preparado para isso, ainda não está. É preciso dar a importância. É preciso dar a importância, a dimensão para os fatos, na medida do tempo. O que era possível exigir nesses momentos? Não posso querer atribuir àquele momento, àquela circunstância, o que eu vou atribuir hoje”.

Apesar disso, Marcos Rogério admite que a compra de vacinas por parte do Ministério da Saúde é algo que precisa ser esclarecido pela CPI. “Aí é outra história. Tem que ver. O Brasil fez uma escolha para realmente não ter vacina? Acho que tem que ser apurado. É outra história porque aí você está falando de uma situação que há um consenso na ciência. A ciência errou muito também. No começo, o que a ciência dizia? Fica em casa. Matou meio mundo de gente. Vamos trazer os cientistas para dentro da CPI para poder enquadrar todos eles também?”, questionou.

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